sexta-feira, 8 de abril de 2011

Bobyshop - ao pé da letra: Loja de Corpos


Kombi lotada

Recentemente tive a oportunidade de trabalhar com Cláudio Pires e, apesar da sua imensa experiência profissional e dedicação ao estudo da engenharia de software, até então não tinha tido o contato com o modelo de bodyshop, o que causou estranheza e até uma certa revolta. Como este modelo é um velho conhecido meu, vou tentar ajuda-lo a desvendar um pouco esse, digamos, modo de trabalho.

* * *

O Bodyshop é um modelo de negócio e ponto. Como um modelo que se preze ele tem algumas características e fomato que é facilmente replicado.

Sobre modelos, vou falar rapidamente sobre uma entrevista que assisti um vez do presidente da Volkswagen do Brasil. Em certo momento da entrevista ele foi questionado sobre a Kombi e o porque de não moderniza-la, com ar-condicionado, vidros elétricos etc. Sim a velha Kombi que vemos em alguns filmes com hippies e que fazem lotadas pelas nossas cidades. Com muita calma, ele respondeu que as características da Kombi, o público alvo e a sua faixa de preço a colocam em um nicho de mercado, pois essas mesmas características representam um. Se outras montadoras quiserem concorrer com a Kombi, elas que venham para esse nicho.


A Loja


Voltando a nossa loja. Esse modelo é usado quando uma empresa - geralmente de médio para grande porte - precisa terceirizar parte da sua estrutura (no nosso caso: TI) ampliando o seu quadro de profissionais, de maneira geral durante um período limitado de tempo. Para isso a tal empresa recorre a outra empresa especializada que disponha de profissionais capacitados para suprir tal demanda. Fácil, né? E é. Essa idéia fortaleceu no Brasil por volta da década de 90 do século passado com as empresas se especializando em seu negócio, pois não fazia muito sentido uma empresa de egração de energia ter cozinheiros em seu quadro de funcionários, por exemplo.



Este modelo tem três partes muito fortes: A empresa Cliente, a empresa especializada e o funcionário especializado da empresa especializada.

Empresa cliente - Tem a demanda e o dinheiro para contratar. Ela estrutura essa demanda, identifica a quantidade e perfil de profissionais necessários a ela e faz uma concorrência - geralmente por preço (vamos tocar nesse ponto mais adiante). Classicamente a gestão dos profissionais fica com essa empresa cliente.

Empresa especializada - Uma empresa de TI em sua mais ampla definição - desenvolvimento, suporte e outros bichos -, que possui funcionários capacitados e busca demandas para disponibilizar a clientes que necessitem de equipe especializada. Ela sabe quanto custa cada profissional e, basicamente a conta do preço é: Custo de cada profissional * Qtd de profissionais * tempo da prestação de serviço * margem = Preço. Eu disse basicamente.

Funcionário especializado da empresa especializada - O profissional com cursos, certificações que conhece o tipo de serviço a ser executado, naturalmente em diversos níveis - pleno, júnior, estagiário, e até sêniors, que vai trabalhar em uma empresa especializada em busca de aprimoramento profissional, uma carreira e, claro, participar de projetos interessantes.

Simples, né? Não é.

Atrás do balcão



A empresa cliente não sabe exatamente o que quer ou o que precisa, sofrendo de falta de planejamento crônico. De maneira geral, "estima" uma quantidade de pessoas para fazer "um serviço" por tanto tempo quanto seja necessário. Para completar, tem dificuldade de diferenciar atividades estratégicas de desenvolvimento corriqueiro, não consegue avaliar produção e entregas de seus fornecedores; espera pela capacitação adequada, mas não necessariamente solicita isso de forma clara e objetiva. Para aliviar um pouco a qualificação da contratação "exige" CMMI´s e cia. além de certificações dos profissionais. Não sabe exatamente do que precisa, mas se recusa a falar isso abertamente com seus fornecedores.

A empresa especializada não tem os profissionais. Na maioria dos casos ele consegue o contrato e depois os profissionais que não rara as vezes são contratados diretamente para atender a empresa cliente. Na prática, muitas dessas "empresas especializadas" são verdadeiros setores de Recursos Humanos especializados em profissionais de TI. Na composição do preço, quando se contrata profissionais CLT, deve estar previsto os encargos trabalhistas com demissões, férias e outros, fazendo que a margem não seja tão grande assim. O resultado vem mais ao fim do contrato, com as substituições dos profissionais, negociações com valores um pouco menores do que o contrato. Verdade seja dita: não é tão simples. Para um resultado bom, precisa de volume.

Já o funcionário especializado da empresa especializada, quer trabalhar da melhor maneira possível, usando as melhores técnicas. Muitas vezes está em busca de oportunidades e tem muitas idéias. Porém, em muitos casos, esbarra nas limitações do cliente, não tem nenhuma referência da "sua empresa", fica em busca de uma identidade que, na prática não existe. A sua empresa oferece pouco - ou nenhum suporte -, muitas vezes é apenas "a boca do caixa". Enquanto o cliente, não raras vezes, deixa claro que ele é Terceiro (quando na verdade não é Quarteirizado). Em vários momentos quem defende o funcionário é alguém da empresa cliente, pedindo aumento por ele numa inversão total. Quando quer se aprimorar tecnicamente, existem perguntas que lhe são feitas: "-Quem pagará por isso A empresa ou o cliente?", "-Como será o faturamento dos dias ou horas em que você não estiver presente?", "-Passagem aérea, hospedagem? Para que é esse congresso?". Nesse momento esquece-se de que o modelo tem 3 partes interessadas e os questionamentos são colocados como somente uma (o funcionário) quisesse "se dar bem". É nessa hora que a falta de especificação por capacitação do cliente, a ausência de um planejamento mais amplo da empresa aflora e, quem sofre com isso é o funcionário.

Um parênteses. Não ache você que sou do tipo romântico e com visão de esquerda paternalista onde a empresa deve pagar por tudo. A formação é sim obrigação do profissional. Mas o ponto é, ninguém quer negociar, ninguém quer ser parceiro nessa hora e é quase uma gincana conseguir uma liberação de 1 ou 2 dias. Por ninguém entenda o cliente e a empresa especializada. Fecha parênteses.




Além o horizonte



Antes que você desista de atuar nesse formato, primeiro que você tem que aceitar que esse é um modelo de negócio real, que é largamente praticado e que é responsável por muitos salários de muitos profissionais.

O ambiente do cliente, por muitas vezes te dá condições e acesso a vários contatos com pessoas influentes, clientes, parceiros de negócio, fornecedores, permitindo que você vá a lugares que não tinha idéia de existir. O você acha que conseguiria facilmente bater um papo com um arquiteto de software classe mundial de uma empresa de três letrinhas?

Esse ambiente do cliente também tem seus rigores posistivos como, não poder fazer horas extra. Com isso, você pode avançar naquela pós ou permitir que você conclua sua graduação, ir a academia ou dar mais atenção a seus filhos. Decidiamente não estamos falando do inferno na terra.

Agora, você de maneira nehuma é obrigado a trabalhar só nesse formato, mas conheço pessoas que estão felizes há mais de 10 anos no mesmo cliente, na mesma empresa especializada.

Bem verdade também que esse modelo abre oportunidades, como espaço para você se especializar em um determinado negócio ou, principalmente, buscar como gerar valor agregado ao negócio, pois essa preocupação dificilmente está presente nesse modelo.


Abraços,

Wesley


p.s.: Cláudio, obrigado pelo incentivo para esse post e boa sorte no seu novo caminho! Seja Feliz!

4 comentários:

Fernando Bichara disse...

Fala Wesley,

Colocações excelentes e muito didático como sempre! :-)

Espero eu, que este modelo, esteja com os dias contados. Não existe plano de carreira, não existe perspectiva é apenas uma "corrida de ratos".

Abraços,
Fernando Bichara

Anônimo disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Cláudio Pires disse...

Tal como andei comentando durante meu dia de hoje, sua definição de ambiente "nocivo" me soou perfeita! Ou seja, não se trata de um ambiente "impossível", mas a exposição prolongada é desaconselhada...hehehe! Obrigado pelas referências carinhosas no post e "habemus chopp"!!! OBS.: Adorei as imagens selecionadas, super ilustrativas e atribuindo maior originalidade ao texto. Escreva mais!

Marcelo Araujo disse...

Mt bom post. Concordo com todo ele. Só complementaria com a ótica de quem não tem o perfil de ficar 10, 15 anos "alocado" em um único cliente, desempenhando funções que não o fazem crescer na empresa que o paga nem na empresa onde está alocado. Esse tipo de perfil não está no inferno, mas tb não se sente satisfeito em estar no limbo. Pra essas pessoas, acho que o melhor é tentar se vender como um consultor na empresa que o paga. Dessa forma ele ficará alocado em uma série de clientes e terá como mostrar seus resultados de forma concreta. Afinal, como consultor você deve entrar, resolver algo e sair. Isso traz visibilidade e possibilidade de crescimento dentro da empresa.